quinta-feira, 28 de abril de 2016

Fábrica da Jeep completa um ano de operação e desafia o Estado



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Enquanto em Betim (MG) a Fiat Chrysler Automobiles (FCA) parou linhas de produção e deu férias coletivas este mês, em Goiana, na Mata Norte pernambucana, o clima é de comemoração. Nesta quinta-feira (28) faz um ano que o parque industrial, consolidado como o Polo Automotivo do Estado, era oficialmente inaugurado. Entre as muitas promessas de desenvolvimento econômico, uma é incontestável: a chegada da montadora trouxe o início de uma nova realidade para milhares de pessoas empregadas diretamente na fábrica. O desafio, agora, é manter o ritmo para que os pernambucanos fiquem, de fato, com parte dos ganhos que o grupo tem e vai continuar tendo com Renegades, Toros e outros dois modelos que podem sair daqui.

A liderança da FCA no Brasil se deve em boa parte ao desempenho da fábrica em Goiana, a mais moderna do grupo no mundo e cuja presença é um contraste histórico com a atividade que dominava a Zona da Mata até então, a cana-de-açúcar. Ainda que distante da capacidade total, os modelos produzidos aqui, sob a marca Jeep, estão na linha de frente de vendas. Entre fevereiro de 2015 e a primeira quinzena deste mês, foram produzidos 84 mil veículos na montadora de Goiana. Na inauguração, a previsão era que se alcançasse a marca de 250 mil unidades/ano em 2018, porém agora o discurso é de chegar a essa marca de acordo com a demanda – mais alinhado com a realidade do mercado, que se contrai diante da crise financeira.

Outra perspectiva para 2018 era chegar a empregar até 10 mil pessoas no polo. Hoje são oito mil. Contudo, esse número já começou a alterar cenários para quem vive na Mata Norte. Segundo dados do Ministério do Trabalho e Previdência Social, nos últimos 12 meses terminados em março deste ano, o volume de trabalhadores com carteira assinada em Goiana cresceu 10,48%, enquanto em Pernambuco esse percentual foi negativo em 6,95%.

Ambos empregados da Jeep, Magno Martins, 26 anos, e Anderson Souza, 29, estão entre as pessoas que ilustram esses números. Agora com planos de fazer faculdade em engenharia da produção, Magno era mecânico em Paulista (Região Metropolitana da capital), quando soube da vaga. Acabou entrando e virando condutor. Hoje lidera equipes e supervisiona todas as partes móveis acopladas às carcaças que saem da linha de produção. Anderson, supervisor de mecânica, também lidera um time e lembra de quando pegava seis ônibus de linhas regulares para ir ao trabalho antes de conseguir a vaga na Jeep – para onde vai com um transporte só, pago pela empresa. Mas a lembrança mais marcante desde que entrou na companhia é a viagem à Itália para treinamento.

Sócio da consultoria Ceplan, que tem acompanhado o desenvolvimento do polo, Jorge Jatobá lembra que o impacto da chegada da Jeep na vida dessas pessoas não se resume aos empregados, mas se expande pela região. A poucos quilômetros dali, no centro de Goiana, é possível encontrar exemplos disso. Cláudia Edja, 26, saiu da cidade vizinha de Nazaré da Mata para dividir apartamento com mais quatro mulheres em Goiana. O esforço foi para virar gerente da recém-inaugurada Mercadão do Brás, que já existe em Nazaré e em Surubim (a 100 km dali). “A cidade está desenvolvendo e o comércio está crescendo”, afirma.

“Surgiram oportunidades para a região e a situação obviamente é positiva. Sem dúvida, o impacto da crise seria muito maior se não fosse a Jeep”, comenta Jatobá. Ele lembra ainda que um ano é pouco tempo para medir a repercussão do empreendimento, que consumiu R$ 7 bilhões em investimentos. Além da maturação naturalmente necessária para indústrias desse porte, há reflexos de projetos em implantação, como a Unidade de Testes, o Campo de Provas e a Unidade de Projetos, que devem funcionar plenamente este semestre. São três das quatro partes do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da FCA, cujo Centro de Software foi inaugurado em dezembro passado. E, em 2017, deve estar funcionando o segundo parque de fornecedores, em Itapissuma, com 800 empregos diretos.

Conflitos, calotes e atrasos

O caminho da FCA em Pernambuco não flui sem percalços. Entre eles, estão disputas com a prefeitura de Goiana, projetos estratégicos ainda não concluídos pelo poder público e calotes dados por um de seus fornecedores no mercado local.

O empresário Fábio Sérgio, sócio de um restaurante em Goiana, ainda tenta administrar a dívida de R$ 500 mil deixada pela Sumont, uma das fornecedoras da Jeep durante a montagem da fábrica. Junto a outros empreendedores locais, os prejuízos são da ordem de R$ 6 milhões, que ainda são buscados na Justiça. A FCA não se pronuncia sobre o assunto. A Sumont não retornou os contatos da reportagem.

Outro tema que a FCA prefere não comentar é o atraso na entrega de equipamentos de infraestrutura. O Arco Metropolitano, contorno que levaria o tráfego de Igarassu ao Cabo de Santo Agostinho sem passar por Recife e pelas cidades mais próximas, continua emperrado no governo federal. A expectativa é que o chamado “Miniarco”, cuja estimativa de conclusão é 2018, atenue o problema: a rodovia estadual pedagiada contornará somente Igarassu e Abreu e Lima. Outro investimento do governo estadual – que também só deve estar pronto em 2018 – são as obras da linha de transmissão 230 kV e duas subestações. A estrutura vai atender à demanda de energia elétrica de todo o polo industrial de Goiana, mas com foco na Jeep.

No que diz respeito ao poder público, as relações mais estremecidas, entretanto, são com a prefeitura de Goiana, que cobrou R$ 20 milhões à FCA referentes a 28 meses de IPTU. O caso foi levado à Justiça, que deu ganho de causa em primeira instância à empresa. A FCA alega ter recebido do prefeito anterior, Henrique Fenelon, a garantia da isenção. A FCA não comenta o assunto e o prefeito da cidade, Fred Gadelha, não retornou os contatos da reportagem.

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